REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL NO BRASIL
INTRODUÇÃO
No
Brasil ,quando um adolescente comete uma grave infração penal, não apenas passa
a forma parte de estatística de criminalidade, também e principalmente, ativa a
discussão sobre a redução da maioridade penal. A sociedade, temerosa e
inadequadamente informada, clama para que os menores de dezoito anos sejam
considerados penalmente imputáveis.
A
questão da idade para a imputabilidade registra antecedentes desde o Código
Criminal do Império de 1830, o qual determinava a maioridade penal em forma
absoluta a parti dos quatorze anos. Em 1890 foi sancionado o Código Penal
Republicano, que determinou a inimputabilidade até os nove anos, entre essa
idade e quatorze anos os indivíduos estavam sujeitos a avaliação de
discernimento do fato cometido. Tavares
(2014) indica que em 1921, através da Lei 4.242, art. 3,§ 20 se autorizou a
criação de um serviço que atendesse os menores abandonados e delinquentes.
Araujo
(2008) relata que no ano 1927, por meio do Decreto 17.943-A surgiu o Código de
Menores, denominado Código Mello Mattos (1864-1934), codex este que entre outros aspectos avançados para a época, determinava
que o menor de quatorze anos não fosse submetido a processo de qualquer
espécie, e o maior de quatorze e menor de dezoito fosse submetido a processo
especial.
Em
1940, com a sanção do Código Penal, se adotou o vigente critério atual,
determinando a maioridade para dezoito anos. Em 1969 se registra a “morte”
antes de ter vigorado de um novo Código Penal (Decreto-Lei 1.004/69), cujo art.
33 determinava a inimputabilidade relativa para menores de dezoito anos, pois
admitia que se o menor tinha completado dezesseis anos, e revelasse
entendimento do ato cometido, se aplicava a pena prevista para maiores
diminuída desde um Tércio até a metade. O art. 34 preceituava que os menores de
dezesseis quanto os maiores dessa idade e menores de dezoito anos inimputáveis
estariam sujeitos a medidas educativas previstas em legislação especial.
Posteriormente,
em dezembro de 1973, através da Lei 6.016 foram alterados diferentes
dispositivos do Código de 1969, entre eles, os arts. 33 e 34, sendo determinada
a maioridade penal a partir dos dezoito anos em forma absoluta, como também que
os menores dessa idade ficavam sujeitos a medidas educativas.
Em
1988 foi sancionada a atual Constituição Federal, denominada por alguns de
“Cidadão”, a qual em forma inegável expõe a preocupação do legislador pelo
indivíduo. Foi insculpida a minoridade de dezoito anos para a inimputabilidade
no art. 228, restando demonstrado que o critério imperante foi do adolescente
menor dessa idade como um ser em desenvolvimento.
Notadamente,
o Brasil evoluiu em um século, pois no Código de 1890 a inimputabilidade
absoluta se admitia até os nove anos, e na Carta Magna de 1988 aos dezoito
anos, o qual indica um profundo aperfeiçoamento na percepção do desenvolvimento
a respeito da maioridade penal.
Pode
afirmar-se que a justiça é uma forma de vingança “civilizada”, na qual o
cidadão desiste da satisfação por mão própria e açude ao judiciário para obter
o reconhecimento da sua pretensão. No caso da idade para a imputabilidade
penal, cuja discussão por ciclos é provocada intempestivamente pelos meios de
comunicação, por formadores de opinião e aprofundada por opiniões pouco
elaboradas desde o campo jurídico, se assemelha mais à simples vingança de uma
sociedade atemorizada que uma proposta de justiça.
O
presente estudo objetivou compreender os aspectos envolvidos na discussão da
maioridade penal no Brasil, e em forma decorrente, formular posicionamento.
Para tanto, o trabalho foi dividido em três seções. Na primeira se caracterizou
o menor de dezoito anos na perspectiva psicossocial, no entendimento que para
formula opinião resulta necessário conhecer o sujeito-objeto da polêmica.
Na
segunda seção, se aborda a maioridade penal no ordenamento jurídico do Brasil,
de forma que foram tecidas considerações em torno da Constituição Federal de
1988, da sua supremacia, das cláusulas pétreas, do art. 228 e seus reflexos no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e no Código Penal (CP). Na terceira
seção se problematizou a opinião pública, se apresentou informação pouco
difundida entre os cidadãos, se pesquisou na jurisprudência do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) com intuito de
observar os fundamentos das decisões que emitem, a respeito da questão em tela,
os mais altos tribunais do País. Seguidamente se formulou posicionamento
contrário á redução da maioridade penal.
Além
do próprio objetivo de pesquisa, o presente texto acadêmico representa a
pretensão de contribuir com a elucidação de um tema relevância social, desde
que a discussão implica formular argumentos a respeito do que deve fazer a
sociedade brasileira com os menores de dezoito anos que cometem atos
considerados como delitos. Trata-se, sem dúvida, de decidir o destino de
adolescentes infratores, questão da qual decorre a maior importância.
1 A CRIMINALIDADE NO BRASIL
1.1 A criminalidade juvenil.
O
Brasil e considerado um dos países mais violentos do mundo, apresentando taxas
inaceitáveis de homicídios e expansão continua da criminalidade Tal situação
foi gerada por um grande e rápido crescimento populacional que não foi
acompanhado pelo desenvolvimento econômico, responsáveis pela injustiça social,
baixo nível de educação perda de valores, miséria, a desestruturação das
famílias, a falta de bons exemplos, a impunidade, a corrupção, o inchaço das
cidades pelo êxodo rural e a baixa qualificação das forças policiais. As
políticas sociais e econômicas iniquas, finalmente, só tendem a ampliar a
criminalidade e a violência brasileiras em todos os estratos sociais.
Os
menores infratores, na sua maioria são procedentes de famílias desestruturadas,
destituídas de ordem moral ou estudo, com baixa estima e com referências
maléficas, tais como traficantes, viciados e bandidos de toda a natureza,
tendendo a cometer infrações contra o patrimônio a partir 10 (dez) anos de
idade, sob o comando de adultos. A recuperação faz-se muito difícil, pois eles
constituem um grupo frágil, facilmente manipulável e vulnerável a praticas de
atos infracionais por não ter uma perspectiva de visa pessoal familiar e
profissional. Há os que enveredam no crime, mas que, as custas da atenção, amor, educação e respeito
recebido dos pais, da escola e dos educadores em geral, conseguem-se recupera
sem maiores seqüelas.
A
freqüência da ocorrência de atos infracionais cometidos pelos ditos menores,
principalmente o furto, vem aumentando gradativamente e para eles não
participem desse ciclo vicioso é preciso que as famílias e as autoridades
competentes lhes proporcionem estruturas que permitam arrostar as dificuldades
e promover oportunidades para enfrentá-las, evitando assim deliquir. Não se
pode, pois, pretender reduzir ou modificar a criminalidade com o enrijecimento
da lei, mas buscar a efetiva participação do Estado, através de políticas de
inclusão e com a garantia da punibilidade para todos os cidadãos, sem quaisquer
discriminações.
A
crise econômico-social força as crianças e adolescentes a trabalharem nas ruas
para sustentar famílias ou exploradores. Assim, a infância, fase essencial da
formação do individuo, não é vivida e luta pela sobrevivência transformando-os
em presas para o crime. O perfil dos jovens infratores assemelha-se aos de suas
vitimas: sexo masculino, sem qualificação e baixa renda. Tal descrição
corresponde a uma parcela bastante considerável da população brasileira, o que
permite concluir a pobreza não pode ser considerada responsável pela violência,
que fatalmente os pobres estão mais
envolvidos e que ela é apanágio de todas
as classes sociais, o que exige cuidados especiais da sociedade e do Estado
para evitá-la ou refreá-la.
A
evolução e transição da violência tradicional, ligada à vingança, terra e honra
para a violência moderna foi brusca e a sociedade não estava preparada e o
aparato público praticamente inexistia para enfrentar essa nova realidade. As
cidades brasileiras, então defrontaram-se com uma grande alteração da ordem
social, com alto número de assassinatos e latrocínios, principalmente os
provocados por bandos, as chamadas gangues e galeras. As pessoas comuns estão
morrendo por motivos fúteis e as guerras intra e entre quadrilhas são
responsáveis pela alta letalidade entre homens menores de 25 anos de idade. A
crise leva à perda de todos os valores e nessas circunstâncias quaisquer atos
podem gerar manifestações de violência desmedida, o que é agravado por um
aparato policial violento, corrupto e desqualificado, que ao invés de proteger
o cidadão, achincalha-o, agride-o, mata-o institucionalizando tal estado de
coisas.
Impossível
discorrer sobre a extrema desigualdade social sem tratar dos elevados índices
de criminalidade. São diretamente relacionados e quanto maior a concentração de
riqueza e renda, maior é o numero de pessoas destituídas de condições de
dignamente, abandonados a própria sorte, facilmente cooptáveis pelo crime.
A
história do Brasil deixa patente o paternalismo do Estado, atitude que não
permite a formação de uma grande Nação, pois vicia e entorpece o cidadão. Não
bastasse esse senão, a maioria dos programas não logrou êxito, apesar dos
altíssimos investimentos realizados. Na verdade, eles agravaram ainda mais a
concentração de renda e a sociedade continuou em busca de D. Sebastião, do
“Salvador da Pátria”, de um chefe de governo que resolvesse monocraticamente
todos os problemas do país, ao invés de participar ativa e criticamente da
vida política do país, o único caminho
capaz de torná-lo um país mais igualitários e menos violento.
2
CARACTERIZAÇÃO PSICOSSOCIAL
DO
MENOR DE DEZOITO ANOS
Seguidamente
se caracteriza, na perspectiva das ciências humanas, o indivíduo menor de
dezoito anos, por ser o alvo do presente estudo. Todavia, necessário trazer à
discussão que entre o nascimento e a maioridade existem duas etapas na vida das
pessoas notoriamente marcantes, as quais exigem que o operador de direito as
aborde para alcançar conceitualmente aquele ser humano que ainda não é penalmente
maior, embora seja objeto de acaloradas discussões quanto à redução da sua
imputabilidade criminal.
2.1 A infância: desenvolvimento
humano.
Sabe-se
que a Organização Mundial da Saúde (OMS)
caracteriza a adolescência como o período de vida compreendido entre 10 e 19
anos, de forma que para essa entidade, criança é toda pessoa com até dez anos
incompletos. O ordenamento jurídico do Brasil, especialmente a Lei 8.069/90 (e
as respectivas alterações) denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), determina que para os efeitos dessa norma, criança é todo individuo com
até doze anos incompletos, e adolescentes aquele que se encontra entre doze e
dezoito anos (BRASIL, 2010). Não é intenção do presente estudo fixar posição
sobre essa discrepância, apenas informar que existe.
Referente
à infância, ou o período evolutivo que transcorre até alcançar a etapa da
adolescência, Almeida e Cunha (2003) indicam que a idéia primitiva, atravessada
por preconceitos religiosos, representava a criança como um ser imperfeito,
inconcluso, à qual se lhe atribuíam inúmeras deficiências, as que seriam
corrigidas durante o período da vida que finalizava com a idade adulta.
Admitia-se, portanto, a existência de uma contradição entre natureza (o que a
criança “trazia” com ela desde a gestação) e civilização (trata-se das mudanças
positivas que o individuo alcançava através da razão e mediadas pela educação).
Desta forma, percebe-se que houve uma profunda evolução até alcançar um
conceito científico da natureza humana e do seu desenvolvimento.
A
cientifização do desenvolvimento humano, conforme expressam Almeida e Cunha
(2003, p 148) ‘{...} é acompanhada de um estatuto para cada uma das diferentes
etapas que o compõem, o qual define normas, comportamentos e expectativas{...}”.
a palavra estatuto inserida no pensamento transcrito deve entender-se como o
conjunto de normas de conduta e de valores morais que estabelece cada sociedade
em determinado momento histórico. As autoras chamam a atenção, no que tange às
teorias do desenvolvimento humano, para os autores Piaget e Vygotsky entre os
mais caracterizados.
Pereira
(2002) indica que Vygotsky caracterizou a aprendizagem como processo pelo qual
o individuo adquire informações, habilidades, atitudes, valores, etc. a partir
de seu contato com a realidade, o meio ambiente, as outras pessoas. Na teoria
de Vygotsky, a idéia de aprendizagem inclui a interdependência dentre as
crianças e os adultos envolvidos no processo.
Para
Vygotsky (apud Pereira, 2002) a aprendizagem. Possibilita o despertar de
processos internos do indivíduo, ligando o desenvolvimento da pessoa com o ambiente sócio-cultural em que vive; o
homem como organismo não se desenvolve plenamente sem o suporte de outros
indivíduos de sua espécie.
As
características de cada indivíduo vão sendo formadas a partir das inúmeras e
constantes interações com o meio (físico e social, neste último aspecto,
inclui-se a cultura). O modelo psicológico de cada ser humano é construído ao
longo da sua vida através de um processo de interação com o seu meio social,
que possibilita a incorporação da cultura elaborada pelas gerações precedentes.
(VYGOTSKY apud PEREIRA, 2002). Necessário esclarecer que neste contexto, o
conceito de cultura é o que proporciona a antropologia, como o conjunto de
valores, história, costumes e expectativas comuns que se verificam em qualquer
agrupamento humano.
Faria
(1998) explica as idéias de Piaget sobre o desenvolvimento humano,
particularmente, da inteligência. Neste sentido, a autora destaca os cinco
períodos em que o cientista suíço dividiu o processo.
-
Período Sensório-Motor: do nascimento aos dois anos, aproximadamente. A
inteligência trabalha por meio das ações através dos deslocamentos do próprio
corpo. É uma inteligência eminentemente prática.
-
Período Simbólico: dos dois anos aos quatro anos, aproximadamente. Surge a
linguagem, o individuo já pode criar imagens mentais na ausência do objeto ou
da ação, é o período da fantasia, do faz de conta, do jogo simbólico. É o
período em que o indivíduo “da alma” aos objetos (o carro do papai foi ‘dormir’
na garagem).
-
Período Intuitivo: dos quatro aos sete anos, aproximadamente. Observa-se a
existência de um desejo de explicação dos fenômenos. É a “idade dos porquês”, o
individuo pergunta o tempo todo, e consegue distinguir a fantasia do real. Em
termos de comunicação verbal, suas conversações não são longas, mas já é capaz
de adaptar sua resposta às palavras do interlocutor.
-
Período Operatório Concreto: dos sete anos aos onze anos, aproximadamente. O
individuo consolida as observações de número, substância, volume e peso,
ordenam elementos por seu tamanho (grandeza), incluindo conjuntos, organiza o
mundo de forma lógica ou operatória. Participa de grupos maiores, chefiando e
admitindo a chefia, compreende regras, sendo fiéis a ela, e estabelece
compromissos. A conversação longa torna-se possível!
-
Período Operatório Abstrato: dos onze anos em diante. É o ponto mais alto do
desenvolvimento da inteligência e corresponde ao nível de pensamento
hipotético-dedutivo ou lógico-matemático.
O individuo está apto para calcular uma possibilidade. Esta estrutura de
pensamento facilita o surgimento da dialética, a qual permite que a linguagem
ocorra em termos de discussão para se chegar a uma conclusão. Sua organização
grupal admite estabelecer relações de cooperação e reciprocidade. Este último
período corresponde ao início da adolescência.
A
diferença ente Vygotsky e Piaget se encontra em que este último enfatizou os
aspectos estruturais e as leis de caráter universal (de origem biológica) do
desenvolvimento, enquanto o primeiro destacou as contribuições da cultura, da
interação social e a dimensão histórica do desenvolvimento mental (SILVA,
SANTOS; SANTANA, 2006).
Anastasi
(apud Pinheiro, 2010) destaca que se encontra esgotada a discussão sobre quanto
pode ser atribuído a hereditariedade e quanto ao meio no seu desenvolvimento do
indivíduo, e que o importante é identificar o comportamento desses fatores em
cada circunstância que vive a pessoa.
Pinheiro
(2010, p. 10) alerta sobre a relevância da interação entre hereditariedade
(fatores genéticos) e ambientes, pois é:
[...]
extremamente difícil distinguir os efeitos dos dois conjuntos de determinantes
sobre características específicas observadas. Considere-se, por exemplo, o caso
da filha de um bem sucedido homem de negócios e de uma advogada. O
quociente intelectual da menina é 140, o que é muito alto. Esse resultado é o
produto de sua herança de um potencial alto ou de um ambiente mais estimulante
no lar? Muito provavelmente, é o resultado da interação dos dois fatores.
Todavia,
a autora acima citada refere que é possível considerar as influências genéticas
sobre alguns caracteres específicos, tais como:
[...]
altura; inteligência ou agressividade, mas, na maior parte dos casos, de
funções psicológicas (comportamento, emoções) as contribuições exatas dos
fatores hereditários são desconhecidas. Para tais características, as perguntas
relevantes são: quais das potencialidades genéticas do individuo serão
realizadas no ambiente físico, social e
cultural em que ele ou ela se desenvolve? Que limites para o desenvolvimento
das funções psicológicas são determinados pela constituição genética do
individuo? (PINHEIRO, 2010, p. 10)
Conforme
é possível perceber nas explicações trazidas a debate, o desenvolvimento do
individuo na etapa da infância é um processo não apenas complexo, também e por
enquanto resulta incerto em termos de evidências científicas no que tange à
participação do que é herdado e do que é adquirido através da influência
do meio, na conformação da sua
personalidade, e em decorrência, da sua conduta.
Tudo
o que foi discutido tem uma clara articulação com a problematiozação da
adolescência, pois esta é a continuidade do desenvolvimento iniciado na
adolescência, e é o período na vida das pessoas que se encontra sujeito a
discussão para formar convicção a respeito da minoridade penal.
2.2 A Adolescência.
A adolescência, diferentemente da
infância, no é o momento zero na evolução do individuo, representa a comunidade
de um processo já iniciado que se caracteriza por ser o começo do período
operatório abstrato, o último dos períodos indicados pó Piaget.
O
termo adolescente tem como raiz etimológica a palavra do latim adolecere, a
qual significa crescer, brotar, fazer-se grande e surgiu em português, espanhol
e italiano no século XV. Conceitualmente é definido como um período de
desenvolvimento biopsicossocial que se situa entre a infância e a maturidade
(LOPES, SARUÊ, 2008).
Na
perspectiva de Roehrs; Maftum; Zagonel (2010) o adolescente se encontra em uma
fase particular do desenvolvimento humano, situação que exige seja percebido em
seu contexto, com características bio-psiquicas, intelectuais e emocionais
específicas, enfrentando toda a sorte de infortúnios de uma sociedade em rápido
processo de transformação.
Neste
sentido, de acordo com Maakaroun; Cruz; Souza (1991, p.123):
A
adolescência é um marco na vida de qualquer individuo. Trata-se de um período
do ciclo existencial do ser, onde ocorre uma tomada de posição social,
familiar,
Sexual e grupal. É um período da vida marcado por transformações físicas
e emocionais. Um fenômeno psicossocial
cujas manifestações variam em função das
pessoas, da cultura e do ambiente. É um momento conflitivo e de crises. Caracteriza-se
pelo afastamento da família e conseqüentemente imersão no mundo adulto, e busca
de sua identidade.
Percebe-se
que a adolescência é uma etapa que se caracteriza por ser um link entre a
infância e a idade adulta conforme acima exposto por Maakaroun, Cruz, Souza
(1991. Existe consenso entre os estudiosos do comportamento humano em
considerar a adolescência como um período determinante no desenvolvimento, pois
com este encerra-se todo o tríplice processo de maduração (bio-psico-social) do
indivíduo.
As
manifestações mais salientes são: contradições, ambivalências; turbulências,
paixões alteradas, dor, e a presença simultânea de conflitos relacionais com o
meio familiar e social. O adolescente tem a sua saúde sujeita a influências
derivadas das transformações que ocorrem nesse período, e se estendem à sua
sexualidade (ROEHRS; MAFTUM; ZAGONEL, 2010).
Ressaltam-se
mudanças de comportamento e alterações supressivas ao humor, entre outros
aspectos inerentes à adolescência. Domingues; Domingues (2007) enfatizam a
influência hormonal como uma explicação para esses distúrbios. A partir de
certa idade a criança começa a sofrer
mudanças físicas, começa a crescer rapidamente em peso e altura, as formas do
corpo começam a mudar. Essas modificações físicas anunciam o início da
puberdade. A puberdade tem início quando genes “acordam” a glândula pituitária,
localizada na base do cérebro, para que envie mensagens às glândulas sexuais de
forma que estas aumentam a produção dos seus hormônios (DOMINGUES; DOMINGUES,
2007).
Assim,
as modificações na vida do indivíduo durante esta fase são profundamente
marcantes, pois conforme antes exposto, se verifica uma transformação de
criança em adolescente, embora ainda falte um processo decisivo para se tornar
adulto.
Ser
adolescente implica estar exposto a riscos, tais como drogas, excesso de álcool,
tabaco, iniciação sexual precoce que pode derivar em gravidez indesejada,
suicídio, acidentes e conflitos de rua com outros adolescentes, acrescidos de
questões sócio-econômicas e dificuldade de relacionamento com a família e
professores (ROEHRS; MAFTUM; ZAGONEL; 2010).
Crivelatti,
Durman, Hofstatter (2006) indicam que os adolescentes se deparam com situações
novas e intensas pressões sociais, ambas as questões provocam o aparecimento de
flutuações do humor e mudanças expressivas no comportamento. Em alguns casos
desenvolvem quadros depressivos cujos sintomas se manifestam através de
descontentamento exteriorizar tristeza.
Relatos
de entrevistas a adolescentes expõem a estes como sendo frágeis, solitários,
manifestando que se sentem incompreendidos, excluídos. Necessário entender que,
além das transformações fisiológicas e emocionais decorrentes desta idade,
adolescer também é uma atitude cultural, um posicionamento como ser humano em
uma das fases do seu crescimento, na qual a sociedade não define com clareza
qual o seu papel social, gerando no adolescente o sentimento de inutilidade,
insegurança e confusão (CRIVELATTI, DURMAN, HOFSTATTER, 2006).
De
fato, conflitos importantes podem aparecer no adolescente durante o processo de
construção da sua identidade. As decisões que toma a respeito da sua vida têm
influências na sociedade a qual cobra de cada integrante um papel o mais
definitivo possível, mas estando a identidade de adolescente incompleta,
torna-se para este bastante complexo encontra seu lugar (CRIVELATTI, DURMAN,
HOFSTATTER, (2006).
Durante
o transcurso da adolescência, por ser este um estádio na vida do indivíduo no
qual se encontra exposto a circunstâncias desestabilizadoras, ocorrem uma série
expressiva de definições: sexuais, profissionais, familiares, ainda acontecem
questões que alguns jovens não conseguem responder positivamente, que
interferem no seu universo intelectual e emocional provocando-lhes sofrimento
psíquico (CRIVELATTI, DURMAN, HOFSTATTER, 2006).
Segundo
Savietto; Cardoso (2009) a sociedade atual, que constitui o contexto no qual se
desenvolvem os adolescentes, se caracteriza pela supressão da dor através da
busca permanente do prazer, isto, pela sua vez, impulsiona o uso intensivo de
drogas.
Os
adolescentes experimentam desamparo, provocado pela fragilidade da instituição
família, neste sentido, dois aspectos merecem destaque quanto à família como
lócus da maior importância, não já na formação do indivíduo-criança, e sim na
transformação em indivíduo-adolescente. O primeiro é que atualmente a família
se conforma de acordo com o paradigma de autonomia dos integrantes, de forma
que muitas decisões se tomam em termos individuais, sem qualquer consulta com
os demais parentes. Esse fenômeno inclui tanto adultos quanto adolescentes e se
encontra marcado pela igualdade, de forma que todos são iguais, ou seja,
inexiste a hierarquia (SAVIETTO; CARDOSO, 2009).
O
segundo aspecto que deve ser considerado é que na família contemporânea existem
projetos individuais, cada um com seu próprio “mapa”, este fato provoca,
freqüentemente nos adolescentes desorientação e conflitos, pois a ausência de
um poder real, na opinião de Savietto; Cardoso (2009) pode ser responsável pelo
senso de desamparo.
Notadamente,
a questão sexual tem um importante reflexo na conduta dos adolescentes; nessa
perspectiva, Reato (2001, p. 1) considera que entre todos os aspectos.
[...]
que constituem o desenvolvimento normal do adolescente, provalvemente O item
sexualidade seja aquele considerado como o mais difícil de lidar por pais,
Profissionais de educação e de saúde. Isto porque a abordagem desse tema
Implica trabalhar com dificuldades pessoais e, freqüentemente, com informações
Inadequadas ou insuficientes.
O
adolescente encontra-se em uma posição de clara vulnerabilidade em razão das
múltiplas descobertas que surgem para ele, e pela liberdade que a cultura atual
lhe outorga, sendo evidente que sofre um difícil de educação para
administrar-la, isto provoca um desequilíbrio entre seus atos e sua capacidade
de arcar com as conseqüências.
2.3 Reflexões sobre o adolescente.
As
opiniões dos estudiosos consultados
permitem auferir que não é possível abordar a adolescência por si mesma,
necessário é começar pela infância, pois no período no qual aquela acontece,
finaliza o processo de formação do indivíduo antes de tornar-se um adulto.
As
diferenças entre os posicionamentos de Vygotsky e Piaget não são radicais, cada
um deles expressa uma ênfase específica no que tange ao desenvolvimento do
indivíduo, biologia e conceitos que abrangem todos os indivíduos no segundo.
Nesta
trilha, concorda-se com Anastasi (apud Pinheiro. 2010) que a realidade tem
demonstrado que não é relevante identificar o peso de cada um destes fatores
no desenvolvimento do indivíduo, e sim
como operam em cada situação concreta.
Conforme
exposto, a adolescência é uma FAE profundamente interferida pelo
desenvolvimento biológico, provocando mudanças na conduta, embora seja um erro
conceitual atribuir às alterações toda a responsabilidade pelas mesmas. A
sociedade como macro-contexto, e a família como micro-cosmos influenciam o
adolescente ao ponto de lhe provocar o senso de desamparo e conflitos.
Novos
paradigmas familiares, os quais não alteram o conceito de família, mas sim a
forma em que esta se organiza, provocam nos indivíduos adolescentes
desassossego por não encontrar firmeza nos parentes (a autoridade nas famílias
atuais de dilui) para acompanhar-los na resolução dos seus conflitos.
Todavia,
os autores consultados ressaltam que a sociedade exige que os jovens definam
seu papel social, quando deveria ser exatamente ao invés: eles deveriam ter
resolvida a questão por parte dos adultos. Estes reclamam que os adolescentes
se encontrem ligados com as exigências do futuro, que se preparem intensamente
para ingressar no mercado de trabalho, são indivíduos com uma propensão de
consumo muito alta.
As
empresas investem pesado em campanhas publicitárias para que aceitem seus
produtos, pretendem seduzi-los, o que provoca uma necessidade de consumo ainda
maior, e alarmantemente, por vezes os meios para conseguir os recursos que lhes
permitam aceder às diferentes propostas são eticamente reprocháveis ou
diretamente podem se enquadrados em condutas delitivas.
Frequentemente,
perante um adolescente, as pessoas registram seu desenvolvimento físico e
intelectual, mas esquecem de aprofundar para conhecer sua idade emocional. Se
articulados os três planos: o físico, o intelectual e afetivo se configura o
que o adolescente realmente é um ser em desenvolvimento.
De
fato, o adolescente distingue entre o bem e o mal, mas é necessário que a
sociedade com as suas instituições formadoras, a família e a escola lhe
proporcionem a educação necessária para que faça a escolha certa. Neste
contexto, todavia deve reconhecer-se que o modelo socioeconômico global é
manifestamente excludente, principalmente, por causa do trabalho.
Muitos
adolescentes se encontram objetivamente privados de toda possibilidade de
aceder aos benefícios do progresso, os que se encontram em essa situação têm
consciência do seu provável destino. Eles precisam de respostas e
oportunidades, e a sociedade (os adultos) se encontra ocupada em sobreviver, de
forma que não tem condições de se comprometer com a satisfação das necessidades
dos jovens.
Nas
duas seguintes seções se abordará plenamente a questão da redução da maioridade
penal, embora antecipadamente alerta-se que nenhuma decisão poderá ser
considerada eficaz se em forma preliminar não se assumem as responsabilidades
cabíveis pela situação da criminalidade adolescente no País.
3 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
3.1 história.
O
Brasil foi o país precursor na América Latina e um dos primeiros no mundo a
concretizar em seu ordenamento jurídico a relação da defesa dos Direitos da
Criança com sucesso na normativa internacional.
Esse
processo teve uma mobilização ética, social e política, envolvendo vários
segmentos da sociedade, tais como, representantes do mundo jurídico, das
políticas públicas e do movimento social, bem como de muita força de vontade e paciência
dos dirigentes, técnicos e auxiliares para o atendimento à população
infarto-juvenil, a fim de implantar práticas novas e que dessem resultados.
Não
foi fácil pôr em prática o Estatuto da Criança, pois as mudanças que ocorressem
no Estatuto também implicariam em mudança no trato da questão nos Estados e
Municípios e até mesmo no ordenamento dos órgãos que atuam nessa mesma área. E
o mais complicado era encontrar pessoas que apoiasse e acreditasse que ele
daria certo ou que seria uma solução para os menores de 18 (dezoito) anos.
A
primeira Instituição Brasileira foi a Santa casa de Misericórdia criada em
1543. Na Vila de Santos que tinha como objetivo cuidar dos doentes, órfãos e
desprovidos.
Da
Europa no século XIX veio o sistema de Roda das Santas Casas com o intuito de
amparar as crianças abandonadas e de recolher donativos. Sua estrutura física
propiciava o anonimato das Mães solteiras, que não queriam que sua identidade
fosse revelada Em 1927, o Código de Menores proibiu o sistema de Rodas, fazendo
com que as crianças fossem entregue na Instituição e que cada uma tivesse
obrigatoriamente um registro próprio.
As
crianças doentes e principalmente as com moléstias contagiosas eram excluídas
das escolas, mesmo o ensino sendo obrigatório, em 1854. Assim , os direitos das
crianças eram negados ou restritos, faltando nessa época à aplicação de uma
política social mais branda. Em relação ao trabalho do menor ficou
regulamentada, a idade mínima de 12 (doze) anos, pelo Decreto n. 1.313, em
1981.
No
começo do século XX, entre os anos de 1990 a 1930, o Brasil-República foi
marcado por lutas sociais, liderados por trabalhadores urbanos. Em 1917, surgiu
o Comitê de Defesa Proletária, que lutava contra o trabalho de menores de 14
(quatorze) anos e do fim do trabalho
noturno de mulheres e de menores de 18 (dezoito) anos.
Na
década de 20, mais precisamente no dia 12 de Outubro de 1927, foi promulgado o
Código de Menores ( Mello Mattos), Decreto n 17.943, com o intuito de trazer
das crianças e dos adolescentes excluídos e desamparados, menores de 18
(dezoito) anos de idade em situação irregular, ou seja, contrária à norma
legal; e em relação ao trabalho infantil, tutela, pátrio poder, liberdade
vigiada e delinqüência, bem como cuidar das questões de higiene da infância.
Mattos foi o primeiro juiz de Menores da America Latina, porem era revestido
pelo por esse Código.
No
período do Estado Novo (1930-1945), os grandes latifundiários foram derrubados
do poder e com eles surgiu um Estado autoritário que tomou conta da época, por
tornar obrigatório o ensino, por buscar legislação trabalhista, pela tentativa
de cobertura previdenciária associada à inserção profissional, só para aqueles
com carteira assinada.
Mesmo
com todo autoritarismo do Estado Novo foi criado o sufrágio universal,
entidades federais para cuidar dos menores e em 1942, o serviço de Assistência
ao Menor (SAM): órgão equiparado ao sistema prisional, só que funcionava para
os menores com a função de orientar, corrigir e reprimir quando necessário. O
atendimento era diferente para cada menor carente e abandonado; patronatos
agrícolas e escolas de aprendizagem de ofícios urbanos, e para os adolescentes
reformatórios, internatos e casas de correção dependendo do tipo de infração
cometido por eles.
De
1945 a 1964, período marcado por uma constituição liberal e instituições
democráticas, por pluripartidarismo, eleição direta para presidente, liberdade
sindical e direito a greve, independência entre os 3 (três) poderes, o fim da
censura e pena de morte.
Na
década de 50 foi instalado em João Pessoa o escritório do UNICEF, o primeiro projeto
de iniciativa a proteção a saúde da criança e a gestante, em alguns estados
brasileiro, comparado com o SAM, esse projeto tinha tudo para da certo.
O
período da ditadura foi muito marcada por repressões e restrições a liberdade
de opinião e expressão, recuos nos campos dos direitos sociais e instituição
dos atos institucionais que permitiam
punições, exclusões e marginalização política dentre outras foram também novas
ordens do Golpe Militar . Com tantas mudanças foi promulgada em 1967, uma nova
constituição, para normalizar essas práticas.
No
Regime Militar (1964 a 1979) também foi implantado a Fundação Nacional do
Bem-Estar do Menor (FUNABEM), Lei n 4.513 de 01 de 12 de 1964, com objetivo de
formular e implantar a Política Nacional do Bem Estar do Menor, herdando do SAM
a cultura organizacional. O foco maior dessa instituição era assistência a
infância, tanto dos abandonados e carentes como dos infratores, considerado em
situação irregular. E no plano estadual as Fundações Estaduais do Bem Estar do Menor (FEBEMS).
O
Código de Menores de 1979, Lei 6697 de 10 de 10 de 1979, tomou como base o de
1927, porém manteve a sua essência que é a arbitrariedade, assistencialismo e
repreensão junto a população infanto-juvenil, tratando da proteção e vigilância
dos menores em situação irregular. Só tendo direito em situação de doença
social ou quando julgada em risco.
A
cada década, o estudo da criança e do adolescente foi crescendo e cada vez mais
se tornou o foco da sociedade, e até nas Universidades o assunto da política
social e dos Direitos Humanos tomou um rumo inesperado permitindo uma abertura
democrática, o exemplo disso foi a Constituição de 1988, que abriu as portas
para uma cidadania mais igualitária e justa.
A
década de 80 se destacou pelas conquistas dos congressistas nos avanços sociais
da infância que se observa no artigo 227 da Constituição Federal de 1988. Este
artigo relata os órgãos competentes para defesa dos direito dos jovens e os
deveres que estes possuem vejamos:
É
dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao
adolescente, com absoluta prioridade, o direito á vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração,
crueldade e opressão.
A comissão do Estatuto da criança e do
Adolescente teve como colaboradores: o movimento da sociedade civil, os
juristas e os técnicos de órgãos governamentais. Juntamente com esses
movimentos várias entidades não governamentais deram sua colaboração.
No dia 13 de julho de 1990, o Estatuto da
Criança e adolescente- ECA, Lei n 8069, foi promulgado com o intuito de dar
proteção integral à criança e ao adolescente, garantindo a todos um
desenvolvimento sadio e manutenção física e moral, não só daqueles em situação
irregular, mas também daqueles que não tinha seu direito reconhecido. O
Estatuto acaba com a visão de que o menor é o individuo pobre e que a criança é
que provém de uma família rica. Hoje o termo menor segundo o dicionário
jurídico RG-FENIX é: pessoa de qualquer sexo que ainda não atingiu a maioridade,
que se verifica, no país, aos 18 (dezoito) anos completos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA
se firmou na normativa brasileira, através de um processo social que teve
participação do movimento infanto-juvenil, abrangendo as políticas sociais
básicas, políticas de assistência, proteção especial e garantia e defesa de
direitos. Vários meios e formas foram discutidos para que o Estatuto se
tornasse “justo” e possível para as crianças e os adolescentes.
O Brasil apesar das conquistas infantis e
juvenis, ainda tem barreiras que precisam ser ultrapassadas, e a maior delas
são as pessoas não acreditam no avanço e no potencial brasileiro, porém existem
outras que fazem de tudo para que ele se desenvolva. Busca-se uma melhor
solução para situação do adolescente em conflito com a lei, estudando a melhor
medida a ser adotada, firmando as garantias individuais e coletivas para
resolução dos problemas, impondo inclusive deveres, o ponto que muitos
brasileiros pensam que não existe para o menor infrator.
A Lei Estatutária já trouxe vários avanços,
podemos citar como exemplo, a adoção feita por pessoas independente do estado
civil, em relação as medidas do conselho tutelar, o trabalho do menor, dentre
outros. Na realidade, o que falta é uma política pública, pois o povo não
conhece ainda o Estatuto e ele tem que ser aplicado. O Estatuto tem que fazer
valer o seu papel. Hoje não existe mais discriminação em relação aos direitos
fundamentais e deveres da criança e do adolescente, pois o Estatuto da Criança
e do Adolescente os garante, basta que os representantes e órgãos competentes
apliquem-no.
3.2
As medidas sócio-educativas.
Antes de elencar as medidas sócio-educativas
previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA faz-se necessário
comentar a questão de o Estatuto fazer menção a medida sócio-educativa ao invés
de pena.
A distinção entre medidas sócio-educativas e
penas não consiste somente em relação aos indivíduos a quem se destina aplicar
a sanção, mas também consiste em fundamentos e finalidades inteiramente
diversos.
A pena tem como objetivo primordial a
retribuição social ao condenado, a fim
de que se possa pagar pela conduta realizada, reintegrando-o em seguida
a sociedade. Entretanto, em respeito à dignidade e autonomia do mesmo, a
ressocialização pretendida não pode ser imposta. Posto que o delinqüente deve
ser livre para rejeitar toda espécie de tratamento. Por outro lado, a medida
sócio-educativa tem o escopo de ressocializar o adolescente infrator,
reeducando-o para não voltar a cometer atos inflacionais.
3.2.1
Sumário de medidas sócio-educativas.
O Legislador destinou o Capítulo IV, do
Título III, abrangendo os artigos 112 usque 125, do Estatuto da Criança e do
Adolescente – ECA, para tratar das medidas sócio-educativas que poderão aplicar
aos adolescentes que cometerem infrações. O artigo 112 elenca essas medidas,
que preocupam, como o próprio nome diz , em socializar e educar vejamos:
Art.112
-Verificada a prática do ato infracional, a autoridade competente
Poderá aplicar ao adolescente as seguintes
medidas:
I - Advertência;
II – obrigação de repara o dano;
III – prestação de serviços a comunidade;
Iv – liberdade assistida
V – inserção em regime de semiliberdade;
VI – internação em estabelecimento
educacional;
VII – qualquer uma das previstas no art. 101,
I a VI.
É
importante ressaltar que o artigo 146,
do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA consagra a definição da
autoridade competente, ao prelecionar: “ A autoridade a que se refere esta Lei
é o juiz da infância e da juventude, ou juiz que exerce essa função na forma da
Lei de Organização judiciária local”.
1º
- A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de
cumpri-la, as circunstancias e a gravidade da infração.
2º
- Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de
trabalho forçado.
3º
- Os adolescentes portadores de doença mental ou deficiência mental receberão
tratamento individual especializado, em local adequado às suas condições.
Observe-se, a respeito, o que discorre o
magistrado Moacir Rodrigues (2001, p. 18) em seu livro Medidas
Sócio-educativas.
[...]
necessário se torna seja esclarecido o fato de o texto do art. 112 referir-se a
autoridade competente, ao invés de aludir simplesmente à autoridade judiciária. [...] Ora, é muito
fácil de se entender. O juiz da infância e da juventude é o que judica na Vara
Especializada e exclusiva da infância e da juventude. Essas varas estão hoje
praticamente circunscritas às c apitais e Distrito Federal. Na maior parte das
Comarcas, mesmo nas cidades de Grande Porte, normalmente o juiz tem competência
para decidir sobre várias matérias, como Família, Órfãos e sucessões etc.
Exerce ele, também as funções de juiz da infância e da juventude, sendo, via de conseqüência,
também juiz da infância e da juventude.
Com
relação ao parágrafo primeiro do artigo 112, do Estatuto da Criança e do
Adolescente, Wilson Barreira (apud COSTA, 2004, p. 229) assevera que,
No
artigo 1º, o Estatuto, atendendo ao primado estabelecido no revogado Código de
Menores, fixas os critérios norteadores para a aplicação das medidas, repetindo
as regras contidas, respectivamente, nos arts. 4, 13 e 15 do artigo diploma
menorista, afasta-se da teoria da proporcionalidade do Direito Penal-
severidade da pena proporcional à gravidade da infração – para declarar que
toda a atenção é voltada para a pessoa do adolescente, com sua condição
socioeconômica e cultural; que as medidas não são definitivas, devendo ter
caráter pedagógico para proporcionar a reintegração sócio familiar, que o ato
infracional, em si mesmo,é secundário, ocupando o último lugar no enunciado
balizador para a escolha da medida, Em curtas palavras, o Estatuto consagra
como atendimento judiciário, o chamado estudo do caso, como se vê do artigo
186, 2, utilizando assim expressão típica do Direito do Menor.
Entretanto,
para Alyrio Cavallieri (apud MARTINS COSTA, 2004, p. 229),
A
aplicação das medidas que leva em conta a gravidade da infração é princípio de
Direito Penal, por seu caráter retributivo e, portanto, inadequada a este campo
do Direito do Menor. A proporcionalidade foi objeto de prolongadas discussões
no Congresso da Associação Internacional de juízes de Menores e de Família
(Bremen, Alemanha, 1994). O sistema penal adotado em países europeus para
menores de idade, onde proporcionalidade é o principio adotado, foi criticado.
[...] Não cabe, no entanto, em um sistema eminentemente socioeducativo, com o
brasileiro.
3.2.1.1 Advertência.
Advertência
é a espécie das medidas sócio-educativas mais tênues, destinada, evidentemente,
aos adolescentes autores de ato infracional de natureza leve.
Seu
objetivo, como o próprio nome diz, é o de prevenir e reeducar o adolescente,
conscientizando-o a não mais cometer infrações, a fim de que possa continuar a
viver harmonicamente em sociedade.
Para
a aplicação da advertência, em consonância com o parágrafo único do artigo 114,
do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA basta que se tenha a “prova da
materialidade e indícios suficientes da autoria”.
Ressalte-se,
por importante, que a presença dos genitores ou responsável do adolescente infrator
em audiência é indispensável, como afirma Paulo Afonso Garrido (apud COSTA,
2004, p. 232).
Na
audiência, é imprescindível a presença dos pais ou responsável, uma vez que
como principais agentes educacionais deve, além da ciência da advertência, contribuir
para que a admoestação sirva como aviso de que o caminho da ilicitude leva
inexoravelmente à degradação. Serve também a presença dos responsáveis como
garantia de que a censura extravasará os limites do foro, ingressando no
cotidiano como lembrança da nocividade e conseqüência da infração.
3.2.1.2 Obrigação de reparar o dano.
O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA,
em seu artigo 116 especifica, ipsis
Em
se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá
determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o
ressarcimento do dano, ou por outra forma compense o prejuízo da vitima,
parágrafo único. Havendo manifesta impossibilidade, a medida poderá ser
substituída por outra adequada (grifo nosso)
Pode-se
dizer que o dano patrimonial representa-se como qualquer lesão causada aos
interesses de outrem, causando-lhe uma subtração patrimonial. Estabelecendo-se
mediante o confronto entre o patrimônio realmente existente depois do dano e o
que existia anteriormente, ou ainda, o que factivelmente existiria se o dano
não tivesse sido produzido. Por conseguinte, o dano é expresso pela diferença
negativa encontrada nessa operação.
Com
muita propriedade, enfatiza Maria Helena Diniz (2001, p. 237) que, “o dano patrimonial
vem a ser a lesão concreta, eu afeta um interesse relativo ao patrimônio da
vitima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens
materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de
indenização pelo responsável”
Por
outro lado, na prática, a obrigação de reparar o dano tem se tomado uma medida
sócio-educativa de pouca eficiência, pois, na grande maioria dos casos
concretos, são os genitores ou responsável que suportam o prejuízo da vítima,
devido o adolescente não possuir patrimônio próprio.
Caso
não haja condições do adolescente ressarcir o dano causado à vítima a
autoridade judiciária promoverá a substituição da medida sócio-educativa em
questão por outra mais conveniente, conforme estabelece o parágrafo único do
artigo 116, ora em comento.
3.2.1.3. Prestação de serviços à
comunidade .
Institui
a Lei Estatutária, no artigo 117, o seguinte:
A
prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas
de interesse geral, por período não excedente há seis meses, junto a entidades
assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem
como em programas comunitários ou governamentais. Parágrafo único. As tarefas
serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas
durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e
feriados, ou dias úteis, de modo a não prejudicar a freqüência ou jornada
normal de trabalho.
A
medida sócio-educativa da prestação de serviço a comunidade tem recebido
congratulações de todas as classes sociais momente dos familiares dos
adolescentes infratores.
Outro
dado relevante e desconhecido pela
maioria da sociedade está representado pelo quantum de adolescentes em
conflito com a lei em relação ao total de adolescentes do País, em tal sentido,
a organização Pró-menino (2008) informa, com base em dados do IBGE dos anos
2005-2006 que 0,1425% do total de adolescentes (entre 12-18 anos) do Brasil
tinham conflitos com a Lei, o que é igual, em números absolutos a 34.858
indivíduos sobre uma população de 24.461.666 adolescentes.
4 A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
O
debate em torno da redução da maioridade penal no Brasil não é recente. Nos
anos 90 já constituía preocupação na sociedade, que se sentia ameaçada por
ondas de violência praticada por adolescentes. A seguir, se tecem considerações
sobre a opinião pública sobre a redução da maioridade penal, se analisa
jurisprudência, e se encerra a seção com o posicionamento do autor do presente
trabalho.
4.1 Opinião da sociedade.
No
Brasil, a discussão sobre a violência praticada por adolescentes e a redução da
maioridade penal como resposta a mesma não é nova, tanto no âmbito social
quanto jurídico. Também é fato que determinados atos que comovem as pessoas
aviva o debate público, particularmente estimulado pelos meios de comunicação,
os quais frequentemente assumem um discurso marcantemente oportunista. Sem
dúvida existente, no complexo social do Brasil, uma corrente importante de
cidadão que consideram necessária a redução da maioridade penal por se
encontrar inserida dentro do tema pesquisado, mas não foi especialmente o alvo
das investigações.
Necessário
alertar que estes resultados foram obtidos considerando a amostra formada por
um número pequeno de indivíduos (aproximadamente 1.000) e entrevistados em
particulares condições (por telefone), embora a metodologia utilizada permita
inferir que se fossem realizados 100 estudos aplicando o mesmo procedimento,
aproximadamente 95 apresentam resultados semelhantes aos originais.
A
primeira pesquisa, do ano 2007, mostrou que 87% dos entrevistados consideram
que os menores que cometem crime devem receber idênticas penas que os adultos
ou seja, sem qualquer distinção por causa da idade. Entre os que manifestaram
favoráveis, conforme se observa no Gráfico 1, não houve consenso no que tange à
idade:
A
segunda pesquisa somente perguntou sobre a isonomia na punição de adolescentes
e adultos, quando agredida a lei, neste sentido 73% respondem afirmativamente,
18% indicaram que não concordavam e 9% não opinaram. Observa-se que houve uma
diferencia negativa de 14 pontos percentuais entre um estudo e outro (87% -
73%) referente às opiniões favoráveis para redução da idade, embora essa
porcentagem continue sendo expressivamente alta (BRASIL, 2010).
Existe
um antigo provérbio em latim que afirma: Vox
Populi Vox Dei (a voz do povo é a voz de DEUS), de forma que se o
legislador tivesse que guiar-se pelas porcentagens favoráveis à redução da
idade para redução da maioridade penal, esta já estaria vigorando.
Sendo
assim, o operador de direito deve perquinir, visando assumir posicionamento
sobre a questão, se deve ouvir-se a voz do povo e proceder a discutir –se em
sede do legislativo a redução em não menos de dois anos a idade para a
imputabilidade penal, como tem acontecido em outros países.
4.2 Jurisprudência.
As mais altas cortes do país
acatam pacificamente o disposto na Constituição e nas normas
infraconstitucionais sobre a maioridade penal aos dezoito anos. Na
jurisprudência a seguir, se apresentam decisões cujo interesse se localiza
tanto no entendimento do instituto da maioridade penal quanto nos argumentos
com os quais se pronunciam os ministros dos respectivos tribunais.
4.3 Superior Tribunal de Justiça
.
Seguidamente, se apresentam duas
decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) relacionadas com solicitude de
Habeas Corpus que implicam pedido de liberação compulsória para medida
sócio-educativa antecipadamente à idade de 21 anos prevista no Estatuto da
Criança e do Adolescente.
HC 76014 RJ 2007/0019090-8
Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho
Órgão Julgador: TS – Quinta Turma
Julgamento: 13/06/2007
Publicação: DJ 06.08.2007 p.579
Doméstica e particularmente, de exclusão social
sobre aqueles que pertencem às classes sociais menos abastadas.
EMENTA
HABEAS CORPUS. ECA MEDIDA
SÓCIO-EDUCATIVA DE SEMILIBERDADE. ADVENTO DA MAIORIDADE PENAL. PEDIDO DE
LIBERAÇÃO COMPLUSÓRIA. IMPROCEDENTE. ORDEM NEGADA 1. Apesar da lei não tratar expressamente da
ultra-atividade da medida de meliberdade, a partir de uma interpretação
sistêmica do Estatuto da Criança e do Adolescente é semiliberdade são
aplicáveis ao menor mesmo após o advento de sua maioridade penal.
2. Para os efeitos de aplicação da Lei
8.069/90, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato, ex vi
art. 104, parágrafo único do ECA. Precedentes.
3. A liberação compulsória, na
realidade, só se dará aos 21 (vinte e um) anos de idade (art. 121.§ 5o. do
ECA).
4. Ordem denegada, de acordo com o
parecer do MPF (BRASIL. 2010c – grifo no original)
O acórdão acima transcrito mostra
entendimento do egrégio STJ no que diz a respeito da responsabilidade penal e a
imputabilidade penal. Sendo esta última a partir dos dezoito anos, não é óbice
para que o menor seja considerado responsável pela infração, da qual decorrem
as medidas de internação ou semiliberdade conforme disposto no ECA. Para a sua
aplicação, considerou-se a ultra-atividade da lei (pois mesmo que alcançada a
maioridade, será tida em conta a idade em que aconteceu o fato). Por via
interpretativa o STJ aplicou o disposto na Lei 8.069/90 (art. 104, parágrafo
único), e com base na mesma norma foi negada a liberdade compulsória por não
ter atingido a idade de 21 anos.
A interpretação sistêmica do ECA deve
considerar-se como empregada para interpretar o art. 104, pois o seu parágrafo
único não indica especificamente, mesmo que alcançando a maioridade, aplicar-se
à o Estatuto segunda a idade na qual foi cometido o ato, conforme a seguir:
Art.104.
são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas
previstas nesta Lei.
Parágrafo
único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à
data do fato (BRASIL, 2010c-grifo nosso).
Por
outra parte, entende-se que o STJ não apenas fundamenta sua decisão com base na
interpretação sistêmica do ECA, também indica que é esse o procedimento para
entender o sistema jurídico como uma totalidade, relacionando os artigos de uma
lei, como também esta com outras normas, e claro esta, a sua harmonia com a
Constituição.
STJ – HABEAS CORPUS: HC 87044 RJ 2007/0164336-9
Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
Julgamento: 25/02/2008
Orgão Julgador: TS – QUINTA TURMA
Publicação: DJ 17.03 2008 p I
EMENTA
HABEAS CORPUS ATO INFRACIONAL EQUIPARADO
A TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO LIBERDADE ASSISTIDA PRETENSÃO DE EXTINÇÃO DA
MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA. IMPLEMENTO DA MAIORIDADE CIVIL IRRELEVÂNCIA. ORDEM
DENEGADA.
1.
A exegese da norma prevista no § 5º. Do art. 121. Do Estatuto da
Criança e do Adolescente, segundo a qual
a liberação do menor. Nos casos em que aplicadas medidas sócio-educativas em
decorrência da prática de ato infracional, será compulsória aos 21 anos de idade,
não sofreu qualquer alteração com o advento do Novo Código Civil (lei
10.406/2002). Precedentes.
2.
O próprio Estatuto traz a previsão, no§
5º. Do art.121, de que a medida pode ser estendida até os 21 anos de idade,
abarcando, portanto, aquelas hipóteses
nas quais o menor cometeu o ato infracional na iminência de completar 18 anos,
caso contrário, a medida torna-se-ia inócua, impossibilitando a norma de
alcançar seu objetivo precípio de recuperação e ressocialização do menor.
3.
Considerando a interpretação sistêmica
da legislação menorista, tem-se que, para efeitos da aplicação da medida
sócio-educativa, deve ser considerada a idade do autor ao tempo do fato, sendo
irrelevante a implementação da maioridade civil ou penal no decorrer de seu
cumprimento, já que, como visto, o limite para sua execução é 21 anos de idade.
4.
Ordem denegada, em conformidade com o
parecer ministerial (BRASIL, 2010e).
O
acórdão supra reitera entendimento do egrégio STJ no se4ntido de que as medidas
sócio-educativas devem ser cumpridas de forma que possam produzir os efeitos
desejados. Se durante o período de vigência da medida; o menor alcança a
maioridade penal ou civil esta não é óbice para a aplicação da liberdade
compulsória. Todavia, para melhor entendimento, a liberdade assistida decorre
da cessação da internação por ter transcorrido o prazo máximo (lei 8.069/90,
art. 121.§ 4º).
O ministro relator cita no seu voto
outros (HC 74.837/RJ, Rel. Min. Arnaldo
Esteves Lima, DJU 22.10.2007 e HC 80.901/RJ, Rel. Min. Felix Fischer, DJU
05.11.2007) mos quais se repete o mesmo posicionamento de forma que o
entendimento no caso em tela reveste o caráter de diretriz jurisprudencial.
Ainda, o Superior Tribunal considera que a prescrição é cabível nas medidas
sócio-educativas, conforme súmula 338/STI, a teor do disposto nos arts. 109,
inc. IV e 115 do Código Penal, embora inaplicável ao caso apreciado, no qual
deve observar-se o limite de 21 anos para cessação da medida sócio-educativa.
As duas decisões transcritas do
egrégio Superior Tribunal de Justiça mostram que para essa alta corte a
interpretação sistêmica é o procedimento
válido para o entendimento de uma norma. Desta forma, sendo a maioridade penal
aos dezoito anos, as medidas sócio-educativas devem ser cumpridas até o limite
que estabelece a Lei. 8.069/90 no art. 121, caput e §§ 3º e 5º, verbis:
Art.
121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos
princípios de brevidade, excepicionalidade e respeito à condição peculiar de
pessoa em desenvolvimento.
[...]
§
3º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos.
§
5º A liberação será compulsória aos vinte e um anos de idade,
[...]
(BRASIL, 2010C)
Desta forma, não restam dúvidas que a
medida sócio-educativa é a previsão que legislador do ECA considerou aplicável
para infrações cometidas por adolescentes, pois estes são caracterizados como
pessoas em desenvolvimento até atingir a idade de dezoito anos. No mesmo
sentido, as decisões transcritas mostram o entendimento do STJ em relação à Lei
8.069/90, desde que exprime seu texto para a aplicação dos seus dispositivos,
particularmente, na procura de eficácia da internação e sua progressão
posterior para a mimiliberdade ou a liberdade assistida.
4.4 Supremo Tribunal Federal.
A seguir, colocam-se sob análise
duas decisões do Supremo Tribunal Federal. Na primeira se observa que a
fundamentação adotada pelos ministros da mais alta corte do País confirma o
entendimento dominante do STJ no que tange à prevalência da continuidade das
medidas sócio-educativas quando atingida a maioridade penal pelo sócio-educando
durante período em que estas decorrem. A segunda decisão refere-se à medida de
internação por aplicação dos arts. 121 e 122 do ECA, por se tratar de ato
infracional em face de grave ameaça.
STF – HABEAS CORPUS: HC 94.938-0 Rio de Janeiro
Relatora: Ministra Cármen Lúcia
Julgamento: 12.8-08
Órgão Julgador: Primeira Turma
Impetrante: DPE-RJ – Adalgisa Maria Steele Macabu
Coator (a/s-es): Superior Tribunal de Justiça
Publicação: DJE 3.10.08
EMENTA
HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE. MEDIA
SOCIOEDUCATIVA. ART. 121.§5º, DO ESTATUTO: NÃO DERROGAÇÃO PELO NOVO CÓDIGO
CIVIL: PRINCIPIO DA ESPECIALIDADE: REGIME DE SEMILIBERDADE, SUPERVENIÊNCIA DA
MAIORIDADE. MANUTENÇÃO DA MEDIDA: POSSIBILIDADE: PROCEDENTES: HABEAS
INDEFERIDO.
Não se vislumbra qualquer contrariedade
entre o novo Código Civil e o Estatuto da Criança e do Adolescente não menciona
a maioridade civil como causa de extinção da medida socioeducativa imposta ao
infrator: ali se contém apenas a afirmação de que suas normas podem ser
aplicadas excepcionalmente às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade
(art. 121, § 5º). Aplica-se, na espécie, o principio da especialidade, segundo
o qual se impõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, que é norma especial, e
não o Código Civil ou o Código Penal, diplomas nos quais se contêm normas de
caráter geral. A proteção integral da criança ou adolescente é devida em função
de sua faixa etária, porque o critério adotado pelo legislador foi o
cronológico absoluto, pouco importando se, por qualquer motivo, adquiriu a
capacidade civil, quando as medidas adotadas visam não apenas a
responsabilização do interessado, mas o eu aperfeiçoamento como membro da
sociedade, a qual também pode legitimamente exigir a recomposição dos seus
componentes, incluídos ai os menores. Habeas Corpus Indeferido (BRASIL,
2010f).
O acórdão acima transcrito estabelece a
prevalência do ECA quando da apreciação de situações nas quais pretende-se
originar conflito entre o Código Civil e o ECA a respeito do cumprimento de
medida sócio-educativa em razão do limite de idade para a aplicação das suas
previsões. Pondere-se por relevante, que o Supremo considerou a aplicação do
principio da especialidade para decidir conforme o ECA sobrepondo-lo o Código
Civil por conter este último normas de caráter geral.
Ainda, verifica-se na decisão em
tela que o STF considera o critério adotado na legislação como cronológico
absoluto, de forma que face à medida sócio-educativa, não importa se durante
seu transcurso o adolescente adquiriu a maioridade civil, pois as medidas são
eficazes quando respondem à exigência social de que este se aperfeiçoe como
integrante do complexo social. Importante ressaltar que a Ministra Cármen Lúcia
destaca que o ECA estabelece como idade limite os 21 anos, sem indicar que se
trata da maioridade, de forma que os dispositivos do ECA são excepcionalmente
aplicáveis para a fixa etária de 18-21 anos.
STF – HABEAS CORPUS: HC 88.755-4 São Paulo
Relator: Ministro Cezar Peluso
Julgamento: 29/8/2006
Órgão Julgador: Segunda Turma
Impetrante: PGE-SP – Patrícia Helena Massa Arzabe
Coator (a/s-es): Superior Tribunal de Justiça
Publicação: DJ 29.9.2006
EMENTA
INFÂNCIA E JUVENTUDE: MENOR. ATO INFRACIONAL .EUIPARAÇÃO AO CRIME
DE ROUBO QUALIFICADO POR EMPREGO DE AMEAÇA, ARMA DE FOGO E CONCURSO DE PESSOAS.
RESENTAÇÃO. PROCEDÊNCIA. INTERNAÇÃO. ADMISSIBILIDADE. OBSERVÂNCIA DO DEVIDO
PROCESSO LEGAL. HC INDEFERIDO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 121 E 122 DO ECA.
Está em harmonia com o princípio da tipicidade
estrita das fattispecie que autorizam a aplicação de internação, por prazo
indeterminado, a menor que praticou ato infracional mediante ameaça, emprego de
arma e concurso de pessoas (BRASIL, 2010f).
Preliminarmente, destaca-se a necessidade
de esclarecer o conceito de fattispecie. Lima (2010) leciona indicando que é
uma expressão utilizada pelos italianos que significa espécie de fato, sendo
utilizada para se referir a tipicidade. Este último termo é utilizado pela
doutrina brasileira, majoritariamente, para indicar indicio da ilicitude.
Notadamente, a solicitação de Habeas
Corpus se encontra destituída de cabimento por tratar-se a internação medida
extrema frente à gravidade do fato, para tanto, mister se faz procurar o art.
122 do Eca, o qual dispõe, in verbis:
[...]
A medida de internação só poderá ser aplicada quando:
I
– tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a
pessoa;
II
– por reiteração no cometimento de outras infrações graves;
III
– por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente
imposta.
§
1º O prazo de internação na hipótese do inciso III deste artigo não poderá ser
superior a três meses.
§
2º Em nenhuma hipótese será aplicada a internação, havendo outra medida
adequada (BRASIL, 2010c).
Da leitura do dispositivo
transcrito, se deduz a linha de raciocínio do STF, pois para o caso em tela
aplica-se o inc. I, o qual não prescreve internação por tempo determinado,
embora o art. 121 já citado estabelece o tempo máximo de três anos, devendo
evoluir para similiberdade ou liberdade assistida. A impetrante solicitou o HC
com fulcro no § 2º do artigo supracitado, mas não se vislumbra qual alternativa
é possível ao que o artigo dispõe em seu inc. 1º.
As decisões dos mais altos
tribunais do país expões uma linha de entendimento: acatamento ao disposto a
respeito na Carta Magna e no ECA a respeito da maioridade penal aos dezoito
anos, o caráter de pessoa em desenvolvimento que tem o adolescente, mas também
estrito cumprimento das medidas sócio-educativas.
As decisões colocadas sob análise
consistem em quatro Habeas Corpus indiferidos, cabível perquirir os motivos de
serem solicitadas, sendo que é conhecida a diretriz jurisprudencial do STJ e do
STF. A explicação pode se encontrar no desejo dos impetrantes de tirar os
adolescentes dos locais nos quais se encontram internados, pois o estado de
deterioro dos mesmos deve ser contrário a toda possibilidade de recuperação.
Deve entender-se que essa questão não pode ser resolvida pelo judiciário, pois
se trata de uma questão de políticas públicas, o que implica estar indicando o
âmbito do executivo como o lócus natural para implementar as soluções.
4.5
Considerações sobre a redução da maioridade.
Seguidamente se apresenta o
posicionamento assumido em relação à redução da idade para imputabilidade
penal. Para tanto, três são as aspectos que confluem para formar convicção. O
primeiro se relaciona com a visão do adolescente que fornecem a ciências do
comportamento, as quais são auxiliares do Direito.
Na primeira seção do presente estudo
foi possível observar que os estudiosos são concordantes em que a adolescência
é um período na vida do indivíduo que o coloca na posição de ser humano em
desenvolvimento. Não existe evidência científica que possa garantir que o
desenvolvimento humano finaliza, por exemplo aos dezeseis anos, idade a partir
da qual a pessoa poderia ser considerada adulta.
O desenvolvimento não é uma regra
idêntica para todos, de forma que o limite de 18 anos representa uma atitude
prudente frente a um processo incerto em quanto à sua extensão temporal, pois
demonstrado está que se encontra atravessado por processos biológicos de
profunda influência na esfera psicoemocional dos adolescentes.
Um dos mais falazes argumentos
esgrimidos pelos defensores da redução da maioridade penal é que atualmente o
adolescente amadurece mais cedo em razão que o desenvolvimento tecnológico lhe
proporciona em leque maior para compreender sua conduta, para discernir entre o
que é certo ou errado, entre o bem e o mal.
Tal fundamentação é enganosa porque
apresenta ao adolescente, em geral ao ser humano, como apenas porque tem
desenvolvida sua mente, a questão é o seu desenvolvimento emocional.
Quando se admite que o se humano é
uma unidade integrada pelas esferas emocional, intelectual e física, a
argumentação acima perde toda efetividade, pois não se trata apenas de o que o
adolescente enxerga intelectualmente, também como lida emocionalmente com o que
compreende, e nesse ponto é donde se verifica a existência do conflito que
caracteriza a adolescência, pois uma maior nível de entendimento intelectual
não é garantia que será acompanhado pelo respectivo entendimento emocional.
Desta forma, percebe-se que o indivíduo precisa “alinhar” as emoções com a sua
mente.
E na esfera emocional na qual o
jovem tem “metabolizar” a realidade de que por a sua condição social não pode
aceder ao conhecimento e ao consumismo que estimula permanentemente a mídia. A
via do delito para aceder ao proibido, ao inalcançável representa um déficil
nas suas emoções, que lhe impede elaborar outras respostas frente à exclusão
social da qual é vítima junto à sua família.
Todavia, a questão sobre o
argumento que atribui aos adolescentes um amadurecimento mais cedo em razão de
serem possuidores de maior conhecimento, é que este não se distribui
uniformemente entre diferentes camadas sociais. O conhecimento se encontra
condicionado pela distribuição de renda, e deve admitir-se que esta no Brasil,
ainda se mostra profundamente injusta,
A educação é outro fator que
contribui com o desenvolvimento sadio do adolescente, porque a escola é o lócus
natural para sua socialização. No país tem-se conseguido introduzir a quase
totalidade das crianças na escola, mas atualmente a batalha está concentrada em
reter-las.
Outra questão que vigoriza o clamor
social pela redução da maioridade penal são os fatos de violência cometidos por
adolescentes e manipulados em forma oportunista pelos meios de comunicação, os
quais são acompanhados por opiniões de operadores de direito deficientemente
fundamentadas.
No item 3.1 deste estudo, tem-se
exposto informação que mostra dados desconhecidos pela maioria do público, e
que expressam que os adolescentes, longe de serem os vilões, são massivamente
vitimas de violência. Neste sentido, se atribui ao Direito, pela via
legislativa, a responsabilidade de provocar a redução a redução da maioridade penal,
quando todo indica que a violência è essencialmente uma questão de políticas
publicas, e que estas devem originar-se no âmbito do Poder Executivo.
Destarte, impossível negar que a
política econômica (a qual deve visar uma distribuição mais equitativa de
renda), a política social, a política educativa, a política carcerária, a
política destinada aos centros de internação de menores não são atribuição de
outro poder que não seja o Executivo. O Legislativo deve produzir as normas que
as viabilizem, e o Judiciário aplicar a lei. Mas, com uma estrutura pública que
necessita profundas mudanças, clamar pela redução da idade para a
imputabilidade penal constitui em erro
de percepção, pois se constrói o falso paradigma de que encarcerar jovens mais
cedo resolve o problema. Tal visão, se prosperar, tornaria mais grave o
problema, pois dificultaria em maior grau a re-socialização dos jovens,
sendo esta o objetivo precípuo que sempre deve almejar a sociedade.
Em seara jurídica, as argumentações
se concentram em elucidar, em última
instância, se a disposição contida no art. 228 da Carta Magna é cláusula pétrea
ou pode ser modificado pela via de
Emenda Constitucional (poder legislativo derivado), o que acarretaria, em forma
decorrente, a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Código
Penal.
Considera-se que a Constituição de
1988 representa uma acentuada preocupação, manifestada pelo legislador
constituinte, sobre o individuo, tanto que petrificou como super-princípio a
dignidade da pessoa humana, o qual não apenas se manifesta no art.I, inc.III,
também se reitera como pano de fundo em todo o texto.
Alex Mater no art.227 expõe direitos
e garantias para a crianças e adolescentes, do qual emerge em toda a sua amplitude,
o principio do melhor interesse.
Articuladamente penal comece a partir dos dezoito anos.
Uma interpretação holística da Lei
Fundamental permite verificar a sua consistência com o projeto e
intencionalidade do legislador constituinte de 1988, toda vez que preservou o
indivíduo de punição penal até os dezoito anos, como estabeleceu a idade limite
de sessenta e cinco para se aposentar.
Um exemplo de argumentação favorável
à redução da maioridade penal se encontra no pensamento do conceituado
tributarista Harada (2007), autor este que considera que:
[...] o legislador reconhece a maturidade do menor
de 18 anos conferindo-lhe o direito de eleger governantes e representantes nas Casas Legislativas. De duas uma: ou esses
menores têm discernimento para o exercício pleno da cidadania, ou não o têm,
hipótese em que os legisladores teriam contribuído para viciar o processo
eleitoral, de sorte a comprometer a legitimidade dos eleitos, o que não é de
ser admitido, por irrazoável.
Notadamente, o relevante jurista se se
refere ao disposto no art. 14, § 1º, inc. II, alinha “c” da Carta Magna na
questão do direito a votar, mas uma leitura atenta desse artigo demonstra que o
exercício do direito, até os dezoito anos é facultativo, ou seja, o menor foi
investido do direito, mas não foi considerado sujeito da obrigação, aspecto
este que Harada (2007) parece não perceber, embora é consistente com percepção
do legislador de 1988 sobre adolescência.
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Senado Federal Secretaria Especial de comunicação Social Secretaria de Pesquisa
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